A situação dramática da Maternidade Dona Evangelina Rosa, a maior unidade materno-infantil do Piauí, é o fato de grande repercussão no estado esta semana. Mais uma vez, ganhamos as manchetes nacionais por conta de um descaso que tira vidas e ridiculariza nossa terra perante o País. A imprensa noticia que dezenas e dezenas de bebês morreram nos últimos meses na unidade. Se considerarmos ano, o número chega à casa das centenas.
Segundo reportagem exibida no Jornal Nacional na quarta-feira (21), quase 50 bebês morreram na maternidade somente nos meses de setembro e outubro deste ano. Mas falar do número de mortes, nesse caso, é uma tarefa complexa. O caos na maternidade mata muito mais do que podemos imaginar. Junto com os bebês que morreram, em sua grande maioria por descaso do poder público, também morreram sonhos, esperanças, perspectivas.
Quando um bebê morre, muita coisa morre junto. A mãe gestante carrega consigo não somente a vida de um bebê, mas uma vida de esperanças que emerge em torno da sua chegada. Quando um bebê morre, uma família inteira tem sonhos ceifados. Quando um casal retorna para uma cidade longínqua do interior com um recém-nascido morto, ele leva uma série de outras mortes junto. A gravidade é além do que podemos imaginar.
Numa gestação, além do bebê, também são gestados planos, expectativas, felicidades. O quartinho arrumado, as roupinhas, o berço comprado... Mas o descaso destrói muito mais do que se pode pensar. Mãe desolada, pai cabisbaixo, família entristecida... Numa sociedade séria e comprometida com sua gente, a situação da Evangelina Rosa jamais seria admitida. Um espaço onde deveria nascer alegria não pode virar um matadouro de sonhos.
Quase 30 mortes somente em outubro! Justamente o mês da eleição, quando políticos tentam nos convencer falando de sonhos, de esperança, de mudança. Enquanto eles percorriam o Piauí atrás de voto, ambulâncias traziam mães que chegavam à capital também com sonhos, também com esperanças. Mas enquanto muitos deles tiveram um final feliz, muitas mães não tiveram a mesma sorte. O descaso e a negligência as privaram de comemorar.
Falta de seringas, de aventais, de licença sanitária, de fraldas, etc. Mais grave do que isso é a falta de humanidade. Gestores públicos são responsáveis pela coisa pública e não poderiam, jamais, permitir tamanho descaso. Garantir as condições dignas numa maternidade pública da envergadura da MDER não é meramente uma obrigação político-administrativa, mas também uma demonstração de compaixão e de amor para com o próximo.
Talvez esse texto pudesse expressar ainda melhor essa indignação se fosse escrito por uma mulher, mãe, experiente. Sou apenas um jovem jornalista de 26 anos, não tenho filhos e sou consciente de que, nem de longe, sei a real dor que sentem aquelas que são as maiores vítimas de um descaso tão vergonhoso como esse: as mães. No entanto, a dor do outro também precisa nos tocar, mesmo que não a possamos sentir. Chega de tanta negligência!
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